Quando a esmola é grande…o pobre desconfia

Quando a esmola é grande…o pobre desconfia

É esta a sensação, o frio na barriga com que fico quando ouço os diretores da Liga e Pedro Proença explicar que a Centralização dos Direitos Televisivos será o milagre que vai salvar o futebol Português e que as receitas irão duplicar face ao valor atual. A estratégia para isso acontecer? Não dizem, fica para a imaginação do leitor

A criação de um Decreto-Lei que obriga a Centralização a partir da época 2028/2029 surgiu devido a uma recomendação da Autoridade da Concorrência, que foi incapaz de sancionar a concentração das operadoras televisivas na estrutura acionista da Sport Tv em 2016, e que assim acabou com a concorrência. A AdC demonstrou uma série de preocupações devido a esta operação e assume no processo de arquivamento que em condições normais iria aplicar sanções obvias e não permitir esta ação das operadoras televisivas.

Mas uma gralha na Lei da Concorrência não lhes permitiu analisar o processo já que requeria uma “abordagem integral global, e que, portanto, ultrapassa o âmbito da aplicação das regras da concorrência”. Novamente entramos no espectro da imaginação do leitor: se as operadoras que compram os direitos estão em cartel umas com as outras, como vão aumentar as receitas? Quem vai pagar mais se não vão competir e andam todas de mão dada?

Atualmente o mercado dos direitos televisivos encontra-se na mó de baixo, a Liga Francesa implodiu, anda em crise, endividamento e processos judiciais desde 2018 e acabou de negociar por metade do valor expectável. A Liga Holandesa assinou recentemente um contrato de 150M€ por ano pelos seus direitos de transmissão, que inclui a segunda divisão e o futebol feminino. Para efeitos de comparação, a Liga Portugal, que se encontra atrás no ranking UEFA da Liga Holandesa, obteve na época de 2022/2023 cerca de 171M€ somente pela 1º Liga, o que acrescenta mais 10M€ se incluirmos a 2º Liga.

Pedro Proença assim como os diretores da Liga falam sobre a possibilidade deste valor subir para 300/350M€ por ano. No entanto a liga europeia mais comparável à nossa liga em termos de visibilidade, ranking UEFA e demografia (importante no cálculo do número de compradores dos pacotes televisivos) acabou de negociar por menos do que o valor recebido atualmente. O próprio diretor geral da DAZN, Jorge Sousa Pavão, afirma que os valores atuais são demasiado elevados e que as operadoras não conseguem monetizar este valor num mercado interno limitado em que somente 400k utilizadores pagam Sportv

A utilização de IPTVs está banalizada, o consumidor português faz o maior esforço financeiro entre as principais ligas europeias para poder assistir aos jogos tendo em conta o seu poder de compra, as operadoras estão em cartel e potenciais compradores dizem que o valor atual tem de baixar. É preciso realmente o leitor ter uma grande imaginação para poder ver o potencial aumento de receitas com a Centralização. Aplaudo quem o conseguir, tem uma mente criativa de invejar este vosso escritor.

Centralizar para dizer que foi feito e depois culpar o mercado quando não se atingir as receitas, os clubes se tornarem irrelevantes na Europa já que os “3 Grandes+ Braga” irão sofrer uma quebra brutal de receitas e a liga cair a pique no Ranking UEFA. Um prato bem à moda do Proença.