Se antes o futebol era sobretudo um reflexo da paixão e da rivalidade, hoje é também uma poderosa plataforma para promover mudanças comportamentais

Bem sei que o tema pode parecer estranho, para quem procura ler algo sobre o que se passa dentro das quatro linhas e, fora delas, aquilo que influencia o que se lá passa. Não por acaso é o âmago que mais apaixona e, logo, aquilo sobre o qual eu mais escrevo.

Mas hoje devo ter acordado a pensar que “a vida é uma tragédia quando vista de perto, mas uma comédia quando vista de longe” (Charlie Chaplin) e, vai daí, decidi criar alguma distância em relação ao tema habitual (para além de ser matéria da minha área profissional).

E digo isto porque, ao contrário do que ainda muitos pensam, o futebol é cada vez menos e apenas uma disputa por vitórias e títulos. É, cada vez mais, um palco onde se jogam também as batalhas pela preservação ambiental e pela responsabilidade social.

Por isso mesmo, vários clubes de topo assumiram um papel de líderes ambientais, integrando práticas de sustentabilidade e de governação responsável nas suas operações diárias.

Os estádios tornaram-se, assim, laboratórios vivos de eficiência energética e gestão circular, os adeptos são convidados a participar ativamente em campanhas ambientais, e as parcerias comerciais privilegiam marcas com compromissos sustentáveis. Ao mesmo tempo, a narrativa do jogo incorpora temas como neutralidade carbónica, energias renováveis e educação ambiental, criando um impacto que ultrapassa os 90 minutos regulamentares.

Se antes o futebol era sobretudo um reflexo da paixão e da rivalidade, hoje é também uma poderosa plataforma para promover mudanças comportamentais e inspirar soluções para a crise climática. E, à medida que o planeta exige ação urgente, alguns clubes já compreenderam que o golo mais importante pode ser marcado fora das quatro linhas.

Entre todos, o Forest Green Rovers continua a ser a referência absoluta, ainda que, em termos competitivos, seja um clube modesto, que milita no equivalente à 5ª divisão inglesa.

Conhecido como o primeiro clube vegan do mundo, aboliu carne e laticínios das refeições de jogadores e adeptos, reduzindo drasticamente a pegada de carbono associada à alimentação. Funciona com energia 100% renovável, parte gerada por painéis solares instalados no estádio e o resto fornecido por operadores verdes certificados. O relvado é tratado de forma orgânica, sem químicos, com técnicas que promovem a biodiversidade, e é irrigado com água da chuva. Até os equipamentos são produzidos com materiais reciclados, como resíduos de grãos de café. Com iluminação LED, postos de carregamento para veículos elétricos e campanhas para incentivar deslocações sustentáveis, o Forest Green demonstra que a economia verde pode ser aplicada em cada pormenor do futebol profissional.

Então e o Benfica?

Como não poderia deixar de ser, o Benfica é o clube, em Portugal, que mais se destaca pela implementação de uma gestão circular dos recursos. O clube investiu em sistemas de reciclagem em larga escala, na geração de energia solar e na monitorização inteligente do consumo energético.

Além disso, promove programas educativos para escolas e associações, transformando a sustentabilidade numa causa partilhada com toda a comunidade benfiquista.

O Benfica e muitos outros grandes clubes europeus (Real e Atlético de Madrid, Liverpool e City, Wolfsburgo e Dortmund, Juventus) perceberam que a sustentabilidade não é eficaz sem envolvimento humano. Por isso, utilizam as redes sociais para educar e inspirar adeptos, criam experiências ecológicas nos estádios com recolha seletiva de resíduos e energia limpa, organizam eventos comunitários como plantações de árvores e limpezas urbanas, estabelecem parcerias verdes com marcas e ONGs, lançam campanhas de impacto mensurável para reduzir emissões e implementam programas educativos para jovens adeptos. O resultado é uma verdadeira rede de influência ambiental com alcance global.

Ao adotar estas práticas, os clubes não só reduzem emissões e custos, como também geram novas oportunidades económicas. Criam empregos nas áreas da energia renovável, gestão de resíduos e inovação tecnológica, exportam modelos de gestão sustentável para outros setores e posicionam-se players da transição energética.

Nos anos mais recentes, incluindo, de forma bem mais visível, no ano corrente, o futebol provou que pode ser parte ativa da solução para a crise climática. Do pequeno Forest Green Rovers aos gigantes como Liverpool, Real Madrid ou Benfica, todos mostram que ganhar pelo planeta é tão importante como vencer campeonatos. O golo mais importante já não se marca apenas na baliza adversária, mas na preservação do futuro que todos partilhamos.

Posto isto, é voltar a vencer o Nice e arrancar, atrasado, no campeonato, a bater o Estrela na Reboleira, pois, subitamente, comecei a ver, novamente, mais ao perto.